Em 1999, ao concluir a graduação em ciências biológicas na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Débora compartilhou o momento da colação de grau com uma companhia muito especial: sua filha Beatriz, então uma criança pequena, vestia uma beca infantil e celebrava a conquista da mãe ainda nos primeiros anos de vida.
Agora, imagine uma abertura de novela anunciando “muitos anos depois…”. Ao som de uma trilha instrumental nostálgica, surgem imagens da trajetória familiar:
Beatriz, ainda na infância, nutre o sonho de seguir carreira na medicina. Transfere-se para uma instituição de ensino mais exigente, conclui o ensino médio, dedica-se por apenas um ano ao cursinho preparatório e conquista uma vaga na Universidade de São Paulo (USP) por meio da Fuvest. Após a graduação, acumula experiência prática em hospitais e decide prestar a prova para residência médica. Alcança o 1º lugar na especialidade de medicina intensiva no Hospital das Clínicas da USP, iniciando sua formação como residente em 2025.
Enquanto isso, Débora, que já havia se destacado no ambiente acadêmico como professora e coordenadora, revive um antigo propósito: estudar medicina. Motivada pela jornada da filha, ela inicia a preparação para vestibulares. “Sempre escutei da minha filha: ‘Por que não tentar?’. Agora, decidi acreditar que é possível. Já ajudei Beatriz a se formar; quero, agora, conquistar minha própria formação”, conta.
“Não me considero limitada. Nunca me intimidei com desafios ou com a idade. Se demorar um, dois ou até três anos, seguirei firme”, reforça Débora.
Beatriz, a principal entusiasta dessa decisão, emociona-se ao falar da mãe. “Ela esteve presente em cada etapa da minha formação, sempre com dedicação e amor pelo ensino. Quando revelou a vontade de estudar medicina, eu não me surpreendi. Ela é incansável”, afirma.
“Não falo só por ser filha dela, mas porque a admiro profundamente. Ela corre atrás dos seus objetivos com uma força impressionante. Espero, um dia, retribuir tudo o que ela fez por mim.”
Um sonho adiado pelo contexto, não pela vocação
Desde a juventude, Débora já acalentava o desejo de cursar medicina. No entanto, após uma formação escolar totalmente pública, sentia que não teria chances reais de aprovação.
“Em 1995, prestei cursinho e decidi tentar biologia, por ser a área mais próxima do que eu realmente queria. Fui aprovada na Unicamp, USP e Unesp, mas optei pela Unicamp por já residir em Campinas”, relata.
No primeiro ano da graduação, um evento inesperado deu novo rumo à sua vida: a gestação de Beatriz, fruto do relacionamento com um colega de curso, com quem permaneceu casada até 2010.
Mesmo com os desafios, Débora manteve o foco acadêmico. Concluiu o curso em quatro anos, cumprindo todas as etapas, mesmo durante a gravidez. Após o parto, assistia às aulas remotamente nos primeiros meses da filha, e logo retornou presencialmente à rotina intensa da universidade. Com o suporte dos pais, conseguiu conciliar os cuidados com a filha e os estudos rigorosos.
“Fui mãe aos 20 anos. Isso me exigiu maturidade imediata. Meus pais cuidavam da Beatriz enquanto eu frequentava as aulas. Quando voltava, me dedicava integralmente a ela. A responsabilidade precoce moldou minha postura para o futuro”, avalia.
Do laboratório ao sonho de vestir jaleco
Débora seguiu carreira acadêmica, mas nunca deixou de sentir uma conexão com a área médica.
“A ideia de tentar novamente sempre rondava meus pensamentos, mas o envolvimento com a vida universitária, os cargos de gestão e o apoio à minha filha inviabilizavam essa possibilidade”, afirma a bióloga, que atuou como docente e coordenadora de cursos superiores por décadas.
Apesar da filha ter cursado uma universidade pública, os custos de sua manutenção fora do estado exigiam sacrifícios. Com Beatriz agora autônoma e já residente, o sonho adormecido de Débora voltou à tona — impulsionado também pelo incentivo dos próprios alunos.
Trinta anos após seu primeiro vestibular, ela se matriculou no mesmo cursinho preparatório que ajudou a filha na jornada até a medicina: o Poliedro. Dedica os fins de semana exclusivamente aos estudos e à redação, uma das etapas mais exigentes dos vestibulares públicos.
“Quase não saio de casa. Se não estou assistindo aula, estou lecionando. Brinco que estou em modo full time de estudante. É o momento de conquistar aquilo que sempre desejei”, finaliza.
DEMOCRACIAS
- Projeto Inclusão Itinerante chega ao interior do PI promovendo cidadania e dignidade às pessoas com deficiência
- Lula se reúne com Marina Silva para tratar da emergência climática
- PIB da Argentina tem queda de 1,7% em 2024, primeiro ano de Javier Milei
- Governador do PI conhece experiências de veículos e casas abastecidas por hidrogênio na Austrália