Mesmo com a urbanização crescente no Brasil, a maior parte da população quilombola permanece residindo em áreas rurais. Dados inéditos do Censo Demográfico de 2022, divulgados nesta sexta-feira (9) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), revelam que 62% dos quilombolas vivem no campo, enquanto 38% estão em áreas urbanas — uma inversão em relação à população brasileira em geral, onde 87% vivem em cidades.
A pesquisa considera quilombolas todas as pessoas que se autodeclaram pertencentes a esse grupo étnico, independentemente de morarem ou não em territórios oficialmente reconhecidos como quilombos.
Segundo Marta de Oliveira Antunes, pesquisadora do IBGE, o dado é reflexo direto da história da escravidão e dos processos de resistência que levaram à formação de comunidades em áreas isoladas e distantes dos centros urbanos.
“Esse resultado está diretamente vinculado ao passado escravista e à forma como os quilombos se estruturaram como espaços de resistência territorial”, afirma.
Descoberta inédita no Censo brasileiro
De acordo com Fernando Souza Damasco, também pesquisador do IBGE, o dado surpreende por se tratar da primeira vez que o Censo investigou a autodeclaração quilombola, o que torna o levantamento uma fonte essencial para o planejamento de políticas públicas específicas.
“É um grupo populacional ainda fortemente enraizado no meio rural, o que contrasta com a ideia de que o Brasil caminha para o desaparecimento do rural”, observa.
Distribuição por gênero: mulheres buscam o urbano, homens permanecem no campo
Os dados também apontam uma distinção entre os sexos em relação à migração e ocupação do espaço:
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Em zonas urbanas, há uma maior proporção de mulheres quilombolas: para cada 100 mulheres, há 92 homens.
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Nas áreas rurais, o cenário se inverte: 105 homens para cada 100 mulheres.
Segundo Marta Antunes, esse movimento revela que as mulheres estão se deslocando mais para os centros urbanos em busca de melhores oportunidades educacionais e profissionais.
Desigualdade no acesso a infraestrutura básica
Apesar da presença urbana crescente, a população quilombola enfrenta grave déficit em serviços essenciais, especialmente nos territórios rurais delimitados. O levantamento do IBGE evidencia a precariedade do saneamento:
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93,82% das moradias em áreas rurais de territórios quilombolas carecem de saneamento básico adequado.
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Em áreas urbanas, 9,21% dos quilombolas têm acesso precário à água, índice 3,4 vezes maior que a média urbana nacional (2,72%).
Esses dados reforçam a necessidade de ações específicas por parte do Estado, direcionadas à garantia de direitos básicos e inclusão estrutural dessa população.
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